quarta-feira, 28 de abril de 2010
Eu
Quando me olho ao espelho a imagem que vejo surpreende-me. Vejo o meu corpo alterado em relação ao que sinto. Em cada novo olhar a distância assume-se. Pareço diferente. Faz lembrar-me o que se passou, há uns tempos atrás, no reencontro com um velho amigo que, por essa altura, já não via há mais de uma década e que de repente resolveu assinalar a sua existência. Ele esteve na plateia no dia da Mostra de Teatro. Desde que reapareceu temos, quando calha, dividido o tempo entre a conversa e uma quantidade assinalável de sashimi de salmão com mais uns nigiris ou uns makis para substituir o gengibre. Por essa ocasião, depois de ter dado sinal de si, quisemos comemorar tamanha ousadia desse anúncio de que estava vivo bebendo as cervejas necessárias. Encontramo-nos junto ao rio num dia de sol. Quando chegou, depois de mim, considerei aquela figura que se me deparava, não sendo a dele. Mas era. Percebi pelo semblante. Os anos tinham passado. As marcas do tempo eram visíveis. Nem sempre são tão visíveis. Não nos damos conta das transformações permanentes do nosso corpo promovidas pelo tempo. Ou se damos, nada se compara quando a distância trata de se aliar ao tempo. Quanto maior, mais notável. Se não me olhasse ao espelho nos próximos dez anos, que reacção teriam os meus olhos ao voltarem a cruzar-se com o meu reflexo? O tempo devora-nos, como se fossemos cegos, tal e qual a água faz com uma rocha. Cada vez que a olhamos parece igual sem nunca o ser. A erosão é lenta. Nada é igual em cada instante. A permanência não existe. Tudo está em mutação. Eu sou parte da mudança. Do todo. O Todo que é enorme, e que oculta meu corpo. Os milhões de corpos somam-se. Que vale apenas um só? A minha existência física no contexto da história do mundo é insignificante. A história que está longe de estar completa ou bem contada. Sou insignificante no todo. Não existo, existindo. Se fechar o plano, apareço ainda minúsculo. Se o fechar ainda mais no espelho que olho deparo com o corpo que, sendo meu, surpreende-me. Vejo-o diferente relativamente ao que sinto. Em cada novo olhar a distância assume-se. Não significa que não goste do que vejo. Gosto até cada vez mais. E gosto por que é meu lado de fora. É o que me envolve. O que me dá forma. Cada vez que o olho parece-me diferente. Mas não por que está a envelhecer a cada instante mas apenas por que reparo menos nos contornos que o definem, na sua tonalidade que não é única, nos acessórios que o decoram. O corpo serve apenas de suporte ao que realmente sou. É o suporte de mim mesmo. Um mero embrulho. A marioneta que manipulo conforme posso. Que empresto a cada personagem que faço, dentro ou fora do palco. Um corpo que seria diferente se tivesse surgido do outro lado do Mundo. Um corpo que sendo importante não é essencial. Se perder parte do corpo, o que sou permanece, independentemente de onde estou. O que nunca poderá acontecer é perder-me de mim mesmo. Por isso, preciso saber cada vez mais de mim a cada instante. Ir sempre mais fundo. Percorrer-me seguindo-me. Olhando sempre o foco da lanterna. A lanterna que não me deixa perder. Que trarei dentro de mim. Não sou uma imagem. Sou simplesmente… EU.
domingo, 25 de abril de 2010
Tenho-te
A tua boca. O teu cheiro. Um pequeno nada de que posso chamar meu. Sinto-a neste momento. Ela toca-me em cada canto. Por dentro. Por fora. Por mim. A tua boca é um sitio de que posso chamar meu, mesmo que agora não lhe consiga tocar. Ela está em mim. Na minha saliva. Estás na minha boca. A minha boca sabe a ti. Sabe a Luz. Não sabe a uma luz. Sabe a Luz. Tu és a Luz. Apetece-me engolir, mergulhar em cada pedaço de saliva que surge. Parece uma fonte. Cada vez que penso que te tenho na minha boca, a saliva reprosduz-se inundando-me. É uma fonte de ti. Que me alimenta. A fonte. E o cheiro, mesmo que tenue fisicamente na camisola que visto e com a qual vou dormir, é vulcânico em mim. Vou acordar e voltar a dormir, repetidamente, com a mesma camisola até chegares, mesmo que o teu cheiro esteja em cada pedaço do meu corpo, que é teu, não o sendo. Por fora. Por dentro. Por mim. Mesmo assim não posso perder nada do pouco que tenho, sendo muito. É muito. É muito por que o que sinto é tanto. Se te tivesse por completo sem sentir o que sinto seria nada. Para quê ter alguém sem amar? Prefiro não te ter e sentir o que sinto. Penestras-me a cada instante. Ter-te em mim a cada segundo, mesmo que nem sequer te possa tocar. Tu és um sitio de que posso chamar meu, mesmo que não o sejas. És minha. Por que o que sinto é meu, mesmo que não te tenha. E sendo meu, é teu. Claro que quero mais. Muito mais. Mas não te quero sem sentir o que sinto. Sem que sintas o que sinto. Sinto-te. Sinto-te em mim. Por completo. Eu e tu numa estrada que possamos chamar nossa. Só nossa. Não há dois caminhos possiveis. O Amor é tudo. Um todo. O meu todo. O teu todo. O nosso todo. Só para ti. Só para mim. O Amor só tem uma direcção. O nosso caminho mesmo que escolhas outro. Espero-te. Quero que chegues. Virás com o teu cheiro azul. O cheiro igual a ti, que será a minha luz eterna. No momento que é eterno, mesmo que interrompido no minuto seguinte, por que tens de ir. Momentos eternos mesmo que finitos, quero-os, todos, até ao último, mesmo que o último já tenha sido. Mas quero mais. Quero tudo. Todo o tempo. Mesmo que o nosso tempo se esgote no próximo momento. Quero ter-te, sim ter-te, ao teu lado. Pelo Mundo fora sentindo milhares de emoções, milhares de faces, o palco, o corpo, o fluido, o mundo, milhares de vezes chamando-te sempre minha querida, meu Amor, minha Luz. Luz azul. O teu cheiro é azul. Cheiro de Luz. A Luz que me ilumina. Que ilumina o Amor. O meu caminho chama-se Amor. Amo amar. Mesmo que seja dificil dizer. Apetece-me dizer mil vezes. Amor. Amar-me. Amar. Amar-te. Só te Amo a ti. Não consigo Amar mais do isto. Amar tudo. Tu. Eu e Tu. O que sinto é meu. Sinto-te. És minha. Amo um sitio que posso chamar de nosso... em mim, Tu e Eu.
quarta-feira, 21 de abril de 2010
A palavra
Custa-me dizê-la. Não a vejo como uma palavra fácil. Foi sempre assim. Ao pronuncia-la o medo surge. Nem sei se tenho direito a dizê-la, ainda que esteja cá dentro cheia de vontade de viver.
Devia proteger-te. Afinal, o teu Mundo parece bonito. Mas, por que será que treme? Sendo uma questão que se te dirige, a verdade é que também me toca. Até por que sou frágil. E ela, a palavra-chave, quando vem à janela ainda mais frágil me deixa. Fico assustado. Ela quer vir à janela, como sempre quis. Mas nunca lhe dei grandes oportunidades. Eu fecho o estore para que apenas consiga espreitar sem ser vista. Mas, de vez em quando, apanha-me distraído e abre, como que por milagre, o estore e depois as portadas e faz-se anunciar ocupando toda a janela. E de repente, tudo à volta da janela deixa de se ver de tão forte que é a intensidade do foco de luz que a ilumina. Nem sei se tenho o direito de a enclausurar. Nem sei se quero. Não quero. De tal maneira que fico muito feliz quando ela me ludibria, sempre que conseguiu tamanho mérito. Fico feliz mais ainda mais frágil. É como que olhar uma criança, iluminada pelo sol, a brincar num cenário idílico. Porquê enclausura-la? Será que tenho medo que a Luz que a ilumina, de repente, se extinga? Tenho medo sim. Imagina essa criança a brincar nesse cenário idílico e de repente a Sol põe-se! O pôr-do-sol é lindo como ele só. Talvez seja por isso que a chegada da noite não seja tão assustadora. Mas imagina essa criança sem Luz, assim de repente. O cenário apesar de lá continuar, desapareceria. O calor da luz deixaria de se sentir. A frialdade do negrume assumir-se-ia. O cheiro seria diferente. Os olhos deixariam de ver, apesar de não sofrerem de qualquer afecção. A pele ganharia diferente forma. As lágrimas constipariam o cenário. A voz identificaria o sofrimento, tal era o desespero da criança por não ter quem a protegesse. Quem a levasse de volta ao lar, ao impulso, ao afecto… ao leite. Um Adamastor. No entanto, tudo está igual. O que apenas mudou foi a luz que voltará na manhã seguinte. Mas a criança ainda não sabe que tudo está igual, menos a tonalidade. Não sabe que a luz voltará ao amanhacer. Não sabe como se defender. Como encontrar o porto seguro. O Leite. Se não crescer, mesmo que o corpo se torne adulto, nunca viverá. Imagina uma mãe que não deixa o filho sair de casa para evitar qualquer oportunidade de que encontre o perigo. Enclausura-lo é mais fácil. Não o pode perder. Nada ganha. É de um egoísmo prodigioso, atroz. Para além de lhe usurpar a possibilidade de crescer, de aprender, de viver. Isto só é possível por que ela própria não é ninguém sem o rebento. Não existe, existindo. Não é livre. Nunca aprendeu a estar só, a ser capaz de metabolizar perdas ou seja lá o que for. Em consciência ninguém pode escolher tal caminho. Ou pelo menos deixar de tentar outro. A vida é só uma. Ninguém tem direito de o fazer. Não tenho direito de o fazer. Apesar de ser minha, a vida que tenho, não posso censura-la, censurar-me. Independentemente do que o futuro desenhar para mim. O futuro desenha para mim o que eu quiser. Por isso, se viver de janela fechada, o caminho será certamente decrépito, íngreme, incolor, será frio e sem odor, de frugais palavras e de comprimidos compassos. Sem emoções. Lento. Vazio. Fácil, sendo difícil. Não se ganha, não se perde, tudo se perdendo. Sem perigo aparente. Com perigo oculto. O perigo oculto é fulminante. A morte súbita não se faz anunciar ao perigo. Logo, ele não aparece. Mas esteve sempre presente, sempre a crescer, sempre a envenenar. Nem se dá pelo fim. Um percurso somítico, vil, cobarde. O percurso do medo.
Quero Viver-me de Janela aberta, escancarada. Quero tocar-me nos limites. Conjugar-me com todos os verbos. Chorar. Rir. Perder. Ganhar. Dar. Cheirar. Receber. Abraçar. Ouvir. Sofrer. Crescer. Ver. Sentir. Odiar. Aprender. Beijar. Viver-me… AMAR.
Devia proteger-te. Afinal, o teu Mundo parece bonito. Mas, por que será que treme? Sendo uma questão que se te dirige, a verdade é que também me toca. Até por que sou frágil. E ela, a palavra-chave, quando vem à janela ainda mais frágil me deixa. Fico assustado. Ela quer vir à janela, como sempre quis. Mas nunca lhe dei grandes oportunidades. Eu fecho o estore para que apenas consiga espreitar sem ser vista. Mas, de vez em quando, apanha-me distraído e abre, como que por milagre, o estore e depois as portadas e faz-se anunciar ocupando toda a janela. E de repente, tudo à volta da janela deixa de se ver de tão forte que é a intensidade do foco de luz que a ilumina. Nem sei se tenho o direito de a enclausurar. Nem sei se quero. Não quero. De tal maneira que fico muito feliz quando ela me ludibria, sempre que conseguiu tamanho mérito. Fico feliz mais ainda mais frágil. É como que olhar uma criança, iluminada pelo sol, a brincar num cenário idílico. Porquê enclausura-la? Será que tenho medo que a Luz que a ilumina, de repente, se extinga? Tenho medo sim. Imagina essa criança a brincar nesse cenário idílico e de repente a Sol põe-se! O pôr-do-sol é lindo como ele só. Talvez seja por isso que a chegada da noite não seja tão assustadora. Mas imagina essa criança sem Luz, assim de repente. O cenário apesar de lá continuar, desapareceria. O calor da luz deixaria de se sentir. A frialdade do negrume assumir-se-ia. O cheiro seria diferente. Os olhos deixariam de ver, apesar de não sofrerem de qualquer afecção. A pele ganharia diferente forma. As lágrimas constipariam o cenário. A voz identificaria o sofrimento, tal era o desespero da criança por não ter quem a protegesse. Quem a levasse de volta ao lar, ao impulso, ao afecto… ao leite. Um Adamastor. No entanto, tudo está igual. O que apenas mudou foi a luz que voltará na manhã seguinte. Mas a criança ainda não sabe que tudo está igual, menos a tonalidade. Não sabe que a luz voltará ao amanhacer. Não sabe como se defender. Como encontrar o porto seguro. O Leite. Se não crescer, mesmo que o corpo se torne adulto, nunca viverá. Imagina uma mãe que não deixa o filho sair de casa para evitar qualquer oportunidade de que encontre o perigo. Enclausura-lo é mais fácil. Não o pode perder. Nada ganha. É de um egoísmo prodigioso, atroz. Para além de lhe usurpar a possibilidade de crescer, de aprender, de viver. Isto só é possível por que ela própria não é ninguém sem o rebento. Não existe, existindo. Não é livre. Nunca aprendeu a estar só, a ser capaz de metabolizar perdas ou seja lá o que for. Em consciência ninguém pode escolher tal caminho. Ou pelo menos deixar de tentar outro. A vida é só uma. Ninguém tem direito de o fazer. Não tenho direito de o fazer. Apesar de ser minha, a vida que tenho, não posso censura-la, censurar-me. Independentemente do que o futuro desenhar para mim. O futuro desenha para mim o que eu quiser. Por isso, se viver de janela fechada, o caminho será certamente decrépito, íngreme, incolor, será frio e sem odor, de frugais palavras e de comprimidos compassos. Sem emoções. Lento. Vazio. Fácil, sendo difícil. Não se ganha, não se perde, tudo se perdendo. Sem perigo aparente. Com perigo oculto. O perigo oculto é fulminante. A morte súbita não se faz anunciar ao perigo. Logo, ele não aparece. Mas esteve sempre presente, sempre a crescer, sempre a envenenar. Nem se dá pelo fim. Um percurso somítico, vil, cobarde. O percurso do medo.
Quero Viver-me de Janela aberta, escancarada. Quero tocar-me nos limites. Conjugar-me com todos os verbos. Chorar. Rir. Perder. Ganhar. Dar. Cheirar. Receber. Abraçar. Ouvir. Sofrer. Crescer. Ver. Sentir. Odiar. Aprender. Beijar. Viver-me… AMAR.
terça-feira, 13 de abril de 2010
Chorar e rir
Choravam a rir. A cena era dramática, provavelmente a mais dramática da peça.
Explicaram-me no fim que o imparável riso se devia à acção. A acção do momento em que o Artur tira a roupa à Lisa, pouco depois do actor, Artur, abandonar o seu personagem António Serra. A acção, afirmaram, convidava o simpático casal a sair da sala, uma vez que Artur despia à força a sua amante. Ela estava em risco de nudez. Para além de que tinham problemas a resolver. A sós, sem público na sala, estariam melhor. Auto-sugestão que os fez chorar a rir. Eu vi. Faltou-me jogo de cintura mais forte. Se não desfiz a acção, a verdade é que também não tive coragem, no exacto momento da acção, de lhes perguntar por que riam. Podia tê-lo feito no momento em que me dirijo, em que o Artur se dirige ao público para que sejam testemunhas da vida real, para que vejam a vida real e não uma peça de teatro qualquer, apesar da peça em questão ter sido escrita pelo prémio nobel Luigi Pirandello. Depois do espectáculo, o senhor que se ria perdidamente confessou-me que esteve quase a intervir nesse momento em que me dirigia, em que o Artur se dirigia ao público. Pena não o ter feito. Não me explicou por que apenas ficou pela intenção. Para não alterar o guião? Pena não lhe ter perguntado, no momento da acção, por que tanto se ria. No limite, daria para perceber até que ponto era a minha disponibilidade para o personagem. Ou seja, se nesse momento seria o Artur a responder ou o Jorge. Seria o Jorge a alterar o Guião ou o Artur a revelar nova faceta? Um momento verdadeiramente importante pela sua singularidade mas que soube a pouco por ter sido castrado pelo casal que não passou da mera intenção de intervir, mas também por mim próprio ou pelo personagem actor Artur por não termos ido mais além. Quero, um dia, ser capaz de me esquecer de mim, de me emprestar não apenas parcialmente ou por breves instantes aos personagens, mas de me emprestar por completo. Tenho de lhes emprestar tudo o que tenho, toda a minha história, toda a minha verdade para que tenham a vida que merecem durante o exacto momento que é suposto estarem vivos. Quero, preciso de continuar a praticar esta arte que tanto me fascina. No teatro, sinto-me mais perto de mim.
Noutra circunstância, lembro-me que também eu chorei e ri, ao mesmo tempo, quase sem dar por isso. Afinal, era realmente Alta Comédia, da melhor, num dia igual ao outro, apesar de ser véspera de Pascoa, num dia em que vi a melhor peça de teatro de sempre em Portugal, se é que a memória não me atraiçoa. Chorei e ri com a história, com o personagem que Nuno Lopes representava notavelmente na sala estúdio do Teatro que foi inaugurada há 164 anos aquando do 27º aniversário da princesa.
É isto, Alta Comédia. Quando dois sentimentos tão dispares se sucedem sem que haja tempo para se pensar nisso. Chorar porque a cena é dramática. Preciso de sublinhar que a cena pode ser dramática, ou o que quiser, no papel mas se o actor não estiver disponível o personagem não tem conflito, não tem verdade, logo não existe e tudo se perde, por que se perdem as lágrimas ou o sorriso do espectador.
Sim, sublinho que chorei. E quando as lágrimas me caíam, soltou-se um sorriso tão espontâneo que passei a perceber o que é realmente Alta Comédia. Mas sobretudo fiquei feliz por ter percebido que estava entregue a mim mesmo. A atenção estava focalizada no que queria. Até parecia que estava a olhar a realidade. Ou melhor, eu estava a olhar a realidade. A Verdade estava no meio dos personagens. Na plateia está o público. A cena foi-me buscar à plateia. Claro que sim. Aquela história tinha mais do que os dois personagens visíveis. Eu poderia ser um vizinho coscuvilheiro que havia decidido esconder-se atrás da janela, do lado de fora da casa no meio dos arbustos, a espiar tão inesperada visita do irmão de Jack, quinze anos depois de o ter abandonado. Podia ser isto ou aquilo, por que passei a fazer parte daquela história mais do que de mim mesmo. Eu fazia parte daquela história por que estava entregue a mim mesmo. Estava livre. O Homem livre é aquele que aprende a estar consigo mesmo, ou seja, a estar só mesmo que acompanhado. Eu estava só, mesmo estando rodeado de gente. Tinha decidido ir ao teatro sem companhia. Sem bilhete para um espectáculo já esgotado até final da temporada. Como em Londres, há sempre uma reserva que não se confirma. Felizmente. E Tudo fluiu. Eu, as minhas lágrimas, o meu sorriso. Pena foi quando tive de me voltar para fora, para a ficção, no exacto momento em que as luzes acenderam. Os personagens tinham saído de cena. O público fez-se sentir. As luzes foram fronteira entra a realidade e a ficção. A realidade do palco. A ficção da plateia. Preciso de voltar à realidade sempre que possível. Sim, por que quero, preciso de continuar a ver teatro. Na plateia, sinto-me mais perto de mim tal e qual como se estivesse no palco.
Explicaram-me no fim que o imparável riso se devia à acção. A acção do momento em que o Artur tira a roupa à Lisa, pouco depois do actor, Artur, abandonar o seu personagem António Serra. A acção, afirmaram, convidava o simpático casal a sair da sala, uma vez que Artur despia à força a sua amante. Ela estava em risco de nudez. Para além de que tinham problemas a resolver. A sós, sem público na sala, estariam melhor. Auto-sugestão que os fez chorar a rir. Eu vi. Faltou-me jogo de cintura mais forte. Se não desfiz a acção, a verdade é que também não tive coragem, no exacto momento da acção, de lhes perguntar por que riam. Podia tê-lo feito no momento em que me dirijo, em que o Artur se dirige ao público para que sejam testemunhas da vida real, para que vejam a vida real e não uma peça de teatro qualquer, apesar da peça em questão ter sido escrita pelo prémio nobel Luigi Pirandello. Depois do espectáculo, o senhor que se ria perdidamente confessou-me que esteve quase a intervir nesse momento em que me dirigia, em que o Artur se dirigia ao público. Pena não o ter feito. Não me explicou por que apenas ficou pela intenção. Para não alterar o guião? Pena não lhe ter perguntado, no momento da acção, por que tanto se ria. No limite, daria para perceber até que ponto era a minha disponibilidade para o personagem. Ou seja, se nesse momento seria o Artur a responder ou o Jorge. Seria o Jorge a alterar o Guião ou o Artur a revelar nova faceta? Um momento verdadeiramente importante pela sua singularidade mas que soube a pouco por ter sido castrado pelo casal que não passou da mera intenção de intervir, mas também por mim próprio ou pelo personagem actor Artur por não termos ido mais além. Quero, um dia, ser capaz de me esquecer de mim, de me emprestar não apenas parcialmente ou por breves instantes aos personagens, mas de me emprestar por completo. Tenho de lhes emprestar tudo o que tenho, toda a minha história, toda a minha verdade para que tenham a vida que merecem durante o exacto momento que é suposto estarem vivos. Quero, preciso de continuar a praticar esta arte que tanto me fascina. No teatro, sinto-me mais perto de mim.
Noutra circunstância, lembro-me que também eu chorei e ri, ao mesmo tempo, quase sem dar por isso. Afinal, era realmente Alta Comédia, da melhor, num dia igual ao outro, apesar de ser véspera de Pascoa, num dia em que vi a melhor peça de teatro de sempre em Portugal, se é que a memória não me atraiçoa. Chorei e ri com a história, com o personagem que Nuno Lopes representava notavelmente na sala estúdio do Teatro que foi inaugurada há 164 anos aquando do 27º aniversário da princesa.
É isto, Alta Comédia. Quando dois sentimentos tão dispares se sucedem sem que haja tempo para se pensar nisso. Chorar porque a cena é dramática. Preciso de sublinhar que a cena pode ser dramática, ou o que quiser, no papel mas se o actor não estiver disponível o personagem não tem conflito, não tem verdade, logo não existe e tudo se perde, por que se perdem as lágrimas ou o sorriso do espectador.
Sim, sublinho que chorei. E quando as lágrimas me caíam, soltou-se um sorriso tão espontâneo que passei a perceber o que é realmente Alta Comédia. Mas sobretudo fiquei feliz por ter percebido que estava entregue a mim mesmo. A atenção estava focalizada no que queria. Até parecia que estava a olhar a realidade. Ou melhor, eu estava a olhar a realidade. A Verdade estava no meio dos personagens. Na plateia está o público. A cena foi-me buscar à plateia. Claro que sim. Aquela história tinha mais do que os dois personagens visíveis. Eu poderia ser um vizinho coscuvilheiro que havia decidido esconder-se atrás da janela, do lado de fora da casa no meio dos arbustos, a espiar tão inesperada visita do irmão de Jack, quinze anos depois de o ter abandonado. Podia ser isto ou aquilo, por que passei a fazer parte daquela história mais do que de mim mesmo. Eu fazia parte daquela história por que estava entregue a mim mesmo. Estava livre. O Homem livre é aquele que aprende a estar consigo mesmo, ou seja, a estar só mesmo que acompanhado. Eu estava só, mesmo estando rodeado de gente. Tinha decidido ir ao teatro sem companhia. Sem bilhete para um espectáculo já esgotado até final da temporada. Como em Londres, há sempre uma reserva que não se confirma. Felizmente. E Tudo fluiu. Eu, as minhas lágrimas, o meu sorriso. Pena foi quando tive de me voltar para fora, para a ficção, no exacto momento em que as luzes acenderam. Os personagens tinham saído de cena. O público fez-se sentir. As luzes foram fronteira entra a realidade e a ficção. A realidade do palco. A ficção da plateia. Preciso de voltar à realidade sempre que possível. Sim, por que quero, preciso de continuar a ver teatro. Na plateia, sinto-me mais perto de mim tal e qual como se estivesse no palco.
quarta-feira, 7 de abril de 2010
--´-@
Tal qual como que de uma veia se tratasse.
Uma artéria por onde circula o nosso fluido, a uma velocidade vertiginosa, inimaginável, ofegante.
Uma ligação secreta, invisível mas cheia de luz.
A Luz que só os teus olhos vêem, sim, os teus olhos que são os mesmos por onde olho.
Apetece-me fecha-los para sentir ainda mais as pulsações, que são só nossas.
Para ouvir o fluido a correr, o fluido que é só nosso.
A correr de uma coração para o outro.
Corre, ele corre, corre, para o coração que é o mesmo.
Sinto-te mais do que nunca, meu Amor.
Sinto-te a tocar-me o ombro.
O meu ombro esquerdo ganha vida ao sentir o toque da tua face direita.
Os sinais do teu lábio encostam-se ao meu coração.
E eles brilham para meus olhos, que são os mesmos que os teus.
Os teus sinais brilham ainda mais, nesta escuridão.
Sinto-os no meu peito. Sinto-te no meu peito.
Quero que fiques assim, só assim, no meu peito, que é o mesmo que o teu.
Ficar assim, o tempo que for preciso, sem dizer uma palavra.
Rapara no cheiro, huuuummm o cheiro do nosso fluido transpira como um campo das mais belas Flores.
Há flores em todo o lado, pelo mundo inteiro, o mundo que é o nosso.
As flores crescem, sorriem, cantam, brincam, transpiram alimentadas pelo nosso fluido.
Esse fluido secreto, sedento, sincero que faz de estafeta entre o coração, o meu e o teu que é um só.
Sinto-me numa piscina, envolto por todos os lados... envolto de ti, meu Amor!
Quero ficar assim, até voltar a abrir o olhos e ver-te a sorrir.
--´-@
Uma artéria por onde circula o nosso fluido, a uma velocidade vertiginosa, inimaginável, ofegante.
Uma ligação secreta, invisível mas cheia de luz.
A Luz que só os teus olhos vêem, sim, os teus olhos que são os mesmos por onde olho.
Apetece-me fecha-los para sentir ainda mais as pulsações, que são só nossas.
Para ouvir o fluido a correr, o fluido que é só nosso.
A correr de uma coração para o outro.
Corre, ele corre, corre, para o coração que é o mesmo.
Sinto-te mais do que nunca, meu Amor.
Sinto-te a tocar-me o ombro.
O meu ombro esquerdo ganha vida ao sentir o toque da tua face direita.
Os sinais do teu lábio encostam-se ao meu coração.
E eles brilham para meus olhos, que são os mesmos que os teus.
Os teus sinais brilham ainda mais, nesta escuridão.
Sinto-os no meu peito. Sinto-te no meu peito.
Quero que fiques assim, só assim, no meu peito, que é o mesmo que o teu.
Ficar assim, o tempo que for preciso, sem dizer uma palavra.
Rapara no cheiro, huuuummm o cheiro do nosso fluido transpira como um campo das mais belas Flores.
Há flores em todo o lado, pelo mundo inteiro, o mundo que é o nosso.
As flores crescem, sorriem, cantam, brincam, transpiram alimentadas pelo nosso fluido.
Esse fluido secreto, sedento, sincero que faz de estafeta entre o coração, o meu e o teu que é um só.
Sinto-me numa piscina, envolto por todos os lados... envolto de ti, meu Amor!
Quero ficar assim, até voltar a abrir o olhos e ver-te a sorrir.
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sexta-feira, 2 de abril de 2010
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